domingo, 1 de março de 2020

Meu Querido Portugal

Meu querido Portugal...

Aqui vos fala uma portuguesa "café com leite", como vocês meus compatriotas dizem.
Bisneta de Santa Combadão, descendente de Judeus que decidiram vir fazer a vida em África onde ninguém teve a chance de lhes dizer "que voltassem para a sua terra", porque afinal África na altura era dos portugueses, e quem cá nascesse, até ao nascimento da minha mãe, era português também.
Nasci fora de solo português, ao contrário do meu irmão, nasci já de uma mistura de Portugal e África, mas coube-me a ancestralidade e a nacionalidade.

Meu querido Portugal, não vou fingir que não me tocas o coração, que não canto fado com alma, que não choro à beira do Tejo que não me acabo a dançar As Meninas da Ribeira do Sado, que não adoro o cheiro de fumo de Lisboa, ou que douradas não são o meu peixe favorito.

Mas meu querido Portugal, DESIGNORA-TE!!!
É desesperante que não o faças!

Quando não te aguentavas contigo mesmo, de pestes, miséria, crises sociais e sobrepopulação, pegaste numa bandeira com uma cruz arranjando desculpa divina para ires invadir e violar outras terras espalhando terror, desculturalização, apropriando-te de território que não era teu, de gente que não era tua, fazendo filhos em ventres que não honraste, deixando uma herança de roubo e corrupção e agora achas que "os pretos" caíram em teu território por acaso? E dizes que "voltem para a sua terra"??!
Deixa-te disso, que só te envergonhas!
Deixa-te de actos bárbaros contra quem veio de terras que te deram de mamar por séculos!
Devias estar a beijar-lhes os pés, pois forças-te-os a tirarem do seu para carregarem para o teu!
Devias estar a agradecer-lhes por te terem feito enriquecer e sair da miséria em que estavas para hoje poderes cruzar as cidades urbanizadas que o mundo vai olhando agora como o melhor destino turístico!
Devias honrar o sangue mouro, que mouro é negro, não é árabe branco como aparece nos teus livros adulterados de história, para fazeres as tuas gentes acreditarem que és branco "puro", e que corre nas tuas veias.

Devias saber o que é a Mouraria que tanto cantas, de onde saiu o Fado que é património e te leva a glórias em tantos palcos.
Devias saber mais de ti mesmo e do que te faz Portugal antes de abrires a boca para dizeres que qualquer negro volte para a sua terra. Porque é de todo o negro que tu és composto!

É do suór de todo o negro que Portugal existe!
É do ventre de muita negra que o teu povo existe!
É do solo de terras negras que te soubeste pôr de pé!

DESIGNORA-TE!!

Sobre ti mesmo, sobre a tua história, e deixa de ser a tua própria vergonha, que isso só é pura e simplesmente a não aceitação e ignorância de quem tu és.

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