Eu não acredito
que os homens sejam todos iguais ou maus.
Não é a minha
forma de abordar a violência de género que vemos acontecer diariamente. Para
mim as pessoas não são más de essência. Eu acho que todos nós, na nossa forma
mais pura somos amor, o nosso espírito é amor. Por sermos amor na nossa forma
mais pura não é possível sermos puramente maldade. O que eu acredito que
acontece é que vivências, aprendizados, padrões de pensamento, traumas dores,
desequilíbrios na nossa psique e alma nos fazem agir de certas formas menos
harmoniosas. E a violência é a expressão clara do desequilíbrio e desarmonia.
Não é possível
fazermos mal a outra pessoa, por prazer só, quando estamos bem connosco mesmos.
É tanta coisa boa dentro de nós e à nossa volta que a nossa atenção
simplesmente não está para aí virada. As nossas fontes de prazer são coisas que
nos fazem bem a nós. É um estado que quase que nos leva a esquecermo-nos da existência
dos outros a tal ponto nem nos lembramos de lhes fazer mal.
É por sermos amor
na nossa essência que é possível nos arrependermos dos actos maus que cometemos,
pedirmos perdão e não voltarmos a fazê-los. Mas é não compreendendo profundamente
porque é que os cometemos que nos faz voltar a cometê-los.
Imagino que a
maior parte dos homens que são violentos connosco não saberá nos responder
porque é que o é. Alguma coisa nele o impele a fazê-lo. Alguma coisa que está
tão entranhada que ele mesmo não percebe a lógica, mas segue o impulso. Depois
de seguir o impulso tenta arranjar justificações para si mesmo para o ter
feito. E daí ele tem que estabelecer um sistema de crenças que validam os seus
actos violentos: “A mulher é assim, tem que ser disciplinada” ; “A mulher é
inferior, deve-me respeito” ; “É meu dever como homem fazer-me respeitar” ; “Eu
não sou um homem se não for temido”. Da mesma forma que nós mulheres
estabelecemos também a crença de que “os homens batem, e assim é.”
Na minha
perspectiva há no homem um ser em desequilíbrio, profundamente afectado negativamente
por aquilo que o patriarcado lhe ensinou como suas verdades absolutas sobre a
sua masculinidade, mas de uma forma tão velada, que nem ele mesmo percebe. Não
se dá conta.
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Photo by jurien huggins on Unsplash |
Esta semana escrevi
isto no IG sobre o livro de Trevor Noah, “Born a Crime”:
“É brilhante todo
o livro mas preguei-me num aspecto. Na história de violência doméstica que
sofreu a mãe do Trevor, não da perspectiva do sofrimento dela e dos filhos dela
que é um sofrimento real que não podemos desmentir. Mas da perspectiva de Abel,
o marido violento.
Cada vez que Abel
batia, Abel também se desculpava. E desculpava-se de verdade, segundo a
descrição de Trevor. Ele realmente sentia que tinha errado. A sua única
justificação era sempre: "Eu sinto que ela não me respeita." O
"desrespeito" da mãe de Trevor estava simplesmente no facto de ela se
permitir ser um ser humano com liberdades, independência, capacidade de
subsistência e direitos. Isso para Abel era uma afronta!
Não diferente do
que era num Apartheid uma afronta para um branco um negro ter a sua liberdade,
independência, capacidade de subsistência e direitos. Vi um paralelo ali: No
racismo, o negro, ser que é considerado inferior, ao tentar viver a sua plena
liberdade e direitos, afronta o branco. O que o branco considera desrespeito
porque ele mesmo catalogou o negro como inferior. "Ele não tem nada disso,
isto são só direitos meus que sou superior e ao tentar ter
desrespeita-me!" No patriarcado, o mesmo esquema de pensamento está
estabelecido.
O ser humano
sempre procura um outro ser para inferiorizar, para que ele se sinta bem. Mas porque
é que ele n se sente bem? Porque é q não se sente bem sem inferiorizar ninguém?
Porque construiu
uma programação mental que lhe causa constante insegurança e o faz auto desvalorizar-se
por não ser mais do que um outro. O só ser não é suficiente para nós nos
sentirmos bem connosco mesmos.
Nós temos sempre
que ser mais que alguém para nos sentirmos empoderados, e só empoderados nos
sentimos seguros, só empoderados nos sentimos valorizados.
Estupidamente
pomos o nosso valor no "ser mais que" do que no "ser".
Deixamos de dar valor ao que somos para darmos valor só à ilusão do ser
superior.
Ser superior será
sempre uma eterna ilusão porque a nossa mente sempre vai criar um nível acima -
e alguém sempre estará nesse nível acima -, por natureza nós somos insaciáveis
por mais. Mais do que seja: material, espiritual, intelectual, emocional. É o
que nos faz evoluir e isso é bom.
Mas há uma
armadilha... Que é a de nunca nos darmos valor a menos que os outros vejam que
estamos acima de alguém. Deixamos o nosso valor ser dado por terceiros, n por
nós, e para além disso ser dado através da subjugação de um segundo...
Por isso é uma
afronta tão grande para um homem cheio de teorias patriarcais da sua
superioridade, que uma mulher só seja tão humana quanto ele. E pior...
Que os outros vejam que ela é tão humana quanto ele.”
Muitos homens já
têm feito o seu caminho de cura, já sentiram dentro de si que alguma coisa não
está bem e se dedicam a olhar para dentro para procurar o que está em
desequilíbrio para retomar a harmonia, a paz interior, a auto confiança a
validação que vem de si mesmo e não do outro homem. Voltam a conectar-se com a
sua essência de amor.
Eu sou mãe de um
pequeno homem, e quero criá-lo para que seja auto confiante. Para que não
espere validação de ninguém mais a não ser do seu próprio coração. Para que
tenha um coração bom para ele mesmo e para os outros à sua volta. Que seja ele
já um homem curado é uma das minhas prioridades. Deixo ao máximo que a inocência
da infância dele não seja contaminada pela violência mostrada na mídia ou pelos
comentários de “homem não chora”, ou “tens que ser um homem” que muitas vezes
lhe são dirigidos por pessoas no dia-a-dia que sequer têm parte na criação dele.
Deixo-o ser criança pura, amor puro durante o máximo de tempo possível que eu puder,
porque sei que quanto mais ele tiver consciência de ser amor, mais na sua vida
adulta ele será amor. E será amor seguro, sem ter medo nem dúvida de o ser porque
para a sociedade isso pode ser visto como fraqueza da sua masculinidade. Amor é
a força mais poderosa do mundo, ela só fortalece a masculinidade, torna-a
sábia.
Durante muito
tempo quis ter publicamente a conversa que tive com Henda no link que partilho
com vocês.
No dia em que finalmente o consegui, convidei Marinela Mendes e foi
como realizar um sonho. Acredito nas suas palavras, e me guio nelas para educar
o meu filho. Criarmos os nossos filhos tendo a sua essência de amor como
prioridade é uma forma de diminuirmos a violência de género nas próximas gerações.
O que temos mesmo que fazer não é trancar as meninas em casa por medo do que
lhes possa passar na rua, como aconselha “Minha Senhora” do nosso querido Paulo
Flores. Isto só lhes impede de encararem o mundo de frente e irem conquistar,
direito de todo o ser humano. O que temos que fazer é ensinar mais amor e
respeito aos nossos meninos, não procurar separar os géneros, para que eles
vejam que as meninas são tão seres humanos quanto eles, tão capazes quanto
eles, tão cheias de direitos e soberania sobre si mesmas quanto eles.
Aqui vos deixo o live… Disfrutem.
Com amor